BATMAN - O CAVALEIRO DAS TREVAS RESSURGE

25/05/2014 19:31

 

Nota do Site: 5/ 5

 

     À exatamente oito anos atrás, quando assumiu a direção da praticamente falida franquia cinematográfica de Batman, Christopher Nolan obteve êxito ao conceber um argumento que privilegiava aquilo que as produções feitas até aquele momento sobre o Homem-Morcego teimavam em esquecer ou deixar em segundo plano: o drama humano e profundamente intimista de seu protagonista, Bruce Wayne, ao invés da pirotecnia e do teatralismo que seu alter ego sugeria ou despertava, concentrando-se, assim, em seus personagens e seus ótimos arcos dramáticos, construindo, dessa feita, dois pequenos clássicos: Batman Beggins e The Dark Knight.

 

     Neste sentido, foi decisivo para a história que Nolan adaptasse Gotham City, a cidade de Batman, levando-se em consideração cidades comuns, em que situações cotidianas envolvendo o crime e a corrupção tivessem mais peso que os próprios vilões que o herói teria que enfrentar, tornando os esforços de Bruce mais verossímeis e palpáveis. Assim, em todos os três filmes, tanto Batman quanto Ra's Al Gu'l, Espantalho, Coringa, Duas Faces e Bane, personificam todas as contradições existentes em Gotham City, tornando a relação herói/ vilão muito mais complexa e fascinante.


     E eis que chegamos ao terceiro capítulo dessa fascinante trilogia, um capítulo que já começa sob a sombra do espetacular filme anterior, trazendo um Comissário Gordon (Gary Oldman), totalmente constrangido numa cerimônia em homenagem à Harvey Dent, o homem que, indiretamente, foi o responsável pelo exílio auto-imposto de um agora alquebrado e decadente Bruce Wayne (Christian Bale) que, agora, precisa voltar rapidamente à ação, já que uma ameaça tão letal quanto seus inimigos anteriores se aproxima de Gotham: Bane (Tom Hardy). Além disso, Bruce tem que lidar também com a misteriosa presença de uma sedutora e ambígua ladra de jóias, Selina Kyle, além do constante assédio da executiva Miranda Tate (Marion Cotillard), que está a procura de estabelecer parceria com as empresas Wayne para financiar um projeto de vital importância para Gotham City. Além desses, temos também os conhecidos Lucius Fox (Morgan Freeman) e Alfred (Michael Caine), além do explosivo e instintivo policial John Blake.
 

     Tendo nas mãos a responsabilidade de escrever uma história tão boa quanto a antecessora e que fizesse jus à promessa de “conclusão épica” que tanto bradaram os teasers e trailers de produção da época, isso sem falar na escalação de um ator que fizesse frente ao padrão estabelecido por Heath Ledger, Nolan, saiu-se muito bem pois, ao escolher Bane o diretor conseguiu o tom de urgência e ameaça que o filme necessitava, e Hardy, embora claramente prejudicado pelo uso de uma desconfortável máscara (que justifica-se narrativamente, é lícito ressaltar), saiu-se bem ao projetar toda a ameaça do vilão ao adotar uma fala pausada e objetiva, criando uma figura que, embora seja claramente um psicopata, nunca soa como tal. É uma pena que essa composição seja jogada para segundo plano ao final, quando uma dispensável reviravolta diminue drasticamente a importância deste ótimo personagem, em todas as ações que ele forjou até aquele momento.

 

     E se Bane é mal aproveitado pelo roteiro de Jonathan e Christopher Nolan, isso não ocorre com outros personagens, como Selina Kyle, Gordon, Alfred e John Blake. A primeira, é interessante como sua suposta ambiguidade vai abrindo espaço para uma gradual tomada de consciência que nunca deixa de soar orgânico. E é interessante perceber também como Nolan, mesmo escrevendo uma história totalmente diferente para a personagem, nunca deixa de usar certos elementos consagrados nos quadrinhos, como a constante tensão sexual entre ela e o protagonista, bem como suas conhecidas “acrobacias”. E isso sem a necessidade ridícula de dizer: “Miau”!
 

     Gordon é outro que tem sua história ampliada neste último capítulo. Surgindo constrangido e mostrando-se culpado por cultuar uma mentira, o personagem vai gradualmente percebendo que a solução encontrada no filme anterior, mesmo aparentando ser a correta naquele momento, mostrou-se inadequada e até mesmo errônea, uma vez que serve como elemento para Bane aterrorizar cada vez mais Gotham City. E se, no início, ele questiona Batman pela mentira que inventaram, é em uma conversa com Blake que Gordon percebe a grandeza da atitude do Morcego.
 

     Quanto à Alfred, Michael Caine por estar reduzido à pouquíssimas cenas, deixa um pouco de lado sua faceta jocosa e compõe um personagem que teme sinceramente a morte do patrão. E neste sentido, Caine protagoniza dois daqueles momentos que só ele e sua facilidade para a interpretação são capazes de nos proporcionar: a primeira diz respeito à uma fantasia recorrente do velho mordomo, em que este desejava encontrar Bruce casado e com filhos num lugar qualquer, e a outra é referente ao momento em que Alfred, com os olhos marejados, revela ao patrão o conteúdo da carta deixada por Rachel antes de morrer. E como para nos recompensar emocionalmente, Nolan traz Alfred numa última cena, num momento de puro reconforto emocional.
 

     E o que dizer de John Blake? Aparecendo quase que burocraticamente em sua primeira cena, o personagem interpretado pelo ótimo Joseph Gordon-Levitt assume, junto ao Comissário Gordon, a liderança da resistência contra Bane, num momento em que a cidade não mais pode contar com seu herói mascarado. E sua personalidade combativa aproxima-o naturalmente à Bruce e ao Batman, coroando-o com um destino que já especulássemos no decorrer do filme, brindando sobretudo aos fãs dos quadrinhos.
 

     Mas nenhuma dessas histórias é tão importante e com tantas nuances psicológicas do que o próprio protagonista: Bruce Wayne. Resgatando, em The Dark Knight Rises, elementos já desenvolvidos nos filmes anteriores, como a relação do protagonista com seu pai e seu antigo mentor (uma curtíssima e interessante aparição de Liam Neeson), Bruce Wayne surge em cena em total decadência, mostrando-se alquebrado e fragilizado, graças sobretudo a todos os anos em que lutou sob o disfarce de Batman, só para, gradualmente, esforçar-se para voltar à ativa. E nenhuma cena exemplifica tanto essa fragilidade quanto o primeiro embate com Bane, quando este não tem o menor esforço em derrotar e exilar o protagonista.
 

     E é na antiga prisão de Bane que Bruce revive seus antigos temores enquanto acompanha pela televisão e imobilizado numa cama, o vilão sitiar e aterrorizar Gotham, amedrontando-a enquanto promove saques, roubos, sob a pretensão de “lei marcial”. E são as escolhas posteriores e suas consequências que fazem o protagonista repensar o peso que a persona do Batman tem em sua vida. E é na sequência final que percebemos a importância de Bruce para cidade (“Eles sabem quem os salvou. Foi o Batman”), e para os outros personagens. E se em The Dark Knight Nolan nos brindou como uma sequência triste e melancólica, onde o protagonista esgueirava-se nas sombras enquanto fugia da polícia, dessa vez acompanhamos determinado personagem mergulhando nas sombras só para ressurgir possivelmente como um outro herói, fechando a trilogia de forma coesa, deixando claro que o legado de Batman não se encerra ali.

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