INFERNO Nº. 17

17/08/2014 20:54

 

Cotação: 4/ 5

 

Hábil em desenvolver tramas complexas e recheadas de intrigas, sejam estas dramas ou comédias, Billy Wilder notabilizou-se como um dos maiores roteiristas/ diretores que Hollywood já produziu. E sendo Wilder um sobrevivente do holocausto nazista, não é de se surpreender que um de seus melhores trabalhos seja um filme ambientado na segunda guerra, muito embora na minha opinião este eficaz Inferno Nº 17 empalideça diante de outras obras maiores como Crepúsculo dos Deuses, Pacto de Sangue e Quanto Mais Quente Melhor, por exemplo.

Passando-se num campo de prisioneiros de guerra, este filme de Billy Wilder (cujo roteiro foi co-escrito em parceria com Edwin Blum) nos mostra o cotidiano de soldados americanos aprisionados tentando sobreviver aos nazistas a partir de um cotidiano dedicado à elaboração de arriscados planos de fuga e também de momentos mais triviais, como tentar aliviar a dor da prisão por meio de brincadeiras entre os “pares”.

É neste contexto que o filme começa: durante uma tentativa de fuga, arquitetada pelos prisioneiros mas frustrada com a morte dos dois fugitivos, fica claro para todos ali que um deles pode ser um espião plantado pelos alemães a fim de recolher informações destes, recaindo a culpa imediatamente ao prisioneiro, sargento J. J. Sefton (Willian Holden), um sujeito que dedica seus dias a negociar “privilégios” junto aos carcereiros alemães a fim de manter certa “comodidade” naquele contexto, sobretudo a partir do tráfico de “pequenas mercadorias”, como bebida e cigarros. Neste sentido, tendo que lidar com a desconfiança natural de seus companheiros, Sefton dedica-se também a investigar quem dentre aqueles sujeitos possa ser o verdadeiro espião, mas sem, sobretudo, mudar sua postura cínica e provocativa, mesmo que isso lhe custe algumas “escoriações”.

Antes de mais nada, é lícito observar que o tom do filme – classificado por muitos como “drama de guerra” – não tem nada de ostensivamente dramático ou mesmo melancólico. Pelo contrário, indo na contramão do que se poderia se esperar de um filme ambientado na Segunda Guerra, a narrativa de Billy Wilder adota o humor como o principal fio condutor de sua narrativa, utilizando, ao invés disso, da ironia e do deboche para criticar o absurdo da guerra e suas atrozes consequências. Mas aqui, Wilder acerta em cheio ao não apelar para o pastelão ou para a comédia rasgada a fim de provocar humor (afinal de contas, não estamos aqui lidando com nenhum M*A*S*H). O humor, neste caso, mostra-se muito mais circunstancial e esporádico, pontuando aqui e ali cenas que, mesmo insinuando-se como possivelmente tensas, quebra o ritmo propositalmente permitindo que o diretor/ roteirista adicione sua costumeira crítica mordaz para rir de determinadas situações.

O que não quer dizer que Inferno Nº. 17 não tenha aqui e ali cenas mais tensas e dramáticas. Aliás, todo o terceiro ato abre mão do humor que vinha construído no decorrer do filme para abraçar acertadamente o desfecho de sua história, revelando ao final do segundo ato a identidade do verdadeiro espião e criando a expectativa no espectador sobre de que forma ou em que condições Sefton irá revelar tal segredo. Aliás, não deixa de ser memorável, afinal de contas, que mesmo tendo a necessidade de ver seu nome limpo diante dos companheiros, o protagonista não mudará seu comportamento e ambiguidade de caráter, uma decisão acertada e que ganha forma na forma comprometida e intensa com que William Holden encarna seu personagem.

Trazendo um desfecho satisfatório e lógico, Inferno Nº. 17 mesmo assim, empalidece e muito diante de outras obras-primas de seu autor, talvez porque para os dias de hoje, o espectador comum, tão cínico e ávido por narrativas mais cruas e gráficas, talvez não compreenda a abordagem de Wilder, mesmo que, em retrospecto e levando em consideração o ano em que este filme foi lançado (1953), apresenta uma leveza em sua abordagem que contrasta radicalmente com seu contexto histórico, uma coragem típica de um autor que nunca precisou da melancolia e do melodrama para contar suas esplendidas histórias. Seus melhores trabalhos, diga-se de passagem, notabilizaram-se por expor, através do drama e do humor, as mais complexas facetas que seus personagens poderiam oferecer. E isso não poderia ser diferente neste filme que, mesmo aquém dos melhores trabalhos de seu diretor, ao menos nos legou o fascinante e interessante sargento J. J. Sefton!  

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